Às vezes, Marta se despede das coisas que ama.
Coloca o coração em uma mala vermelha, algumas camisetas por cima, e como não acredita nessa história de que não se deve olhar para trás, fica um longo tempo parada na porta de sua vida olhando por cima do ombro. Olhos molhados, pisca uma ou duas vezes e engole a saudade do abandono. O suspiro é longo e passa por todo o corpo, até que ao apertar os lábios e sentir o sal, assiste aos nós desfazendo-se, desde o início da corda que a prende à primeira vez que sentiu frio.
O peito já não carrega o coração, e o ar que agora invade os pulmões vem trazendo de volta aquelas letras que escreviam seu nome quando ela era apenas Marta. É quase como uma dança. De cheiros, de choros, de sensações. E quando pensa consigo mesma, sentindo o vento de dentro balançar os fios de cabelo que caem no rosto, se pergunta quando as vogais foram substituídas?. Mas sabe, e precisa saber, que não é tão simples. Abandonar a si mesma, jogar fora tentativas, malocar o coração na mala e decidir mantê-lo por lá por tempo indeterminado. Nada disso fazia sentido até que entregou nas mãos de outrem a arma carregada que detonaria sua parte intocada. Sua alma, hoje, é capaz de peneirar pedras. Largos rasgos feitos a unha, nas tantas sessões de auto-tortura. Seu algoz, tirano, acertou por vezes pontos distantes de fatais. Os fios do sangue laranja escorriam, pintando o corpo que nada desejava além ficar quente e levemente úmido ao perceber o tom verde se aproximando.
Nunca fora pensado, proposital ou sentido imediatamente. Mas quando percebia, havia escorrido-se lentamente, partindo de dentro e implodido. Toda vez que acontecia, e acontecia desde sempre, mesmo que só tenha ligado uma coisa a outra um tempo depois, ela sorria morotamente passando a língua nos lábios e abrindo um sorriso que de tão SEU já havia dito a que vinha. Olhava para baixo, fitava a declaração da sua entrega, até com certa timidez, mudava o sorriso de lado, inflando os lábios pelo caminho da boca de um canto ao outro, e ao levantar a cabeça, tinha a certeza de que estava diante de algo...
playlistinha - momentos
- Ouça o seu silêncio
22 de fevereiro de 2008
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Um comentário:
foi tu que escreveu a carta. rá.
Cris, a Lisbôa, hoje mais Lisbôa do que nunca
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